No século XVIII, em pleno Optimismo resultante de todas as inovações e possibilidades do período das Luzes, escreveram-se na Europa centenas de tratados sobre a felicidade, geralmente manuais de regras sobre a legitimidade de assumirmos que ela se atinge, seguidos de considerações sobre como conseguir atingi-la. De toda esta multitude confiante, destaca-se, pelas suas características muito próprias, o Discurso sobre a Felicidade de Madame Émilie du Châtelet, agora editado em Português pela Relógio d'Água, com um prefácio sóbrio e esclarecedor de Elisabeth Badinter.
Esta mulher espantosa, e infelizmente pouco recordada pela história, abandonou o marido sem hesitações para ir viver com Voltaire, separou-se dele já em idade avançada, e no entretanto foi musa de vários outros sábios da época, como Maupertuius e Huygens. Além de que foi uma das grandes promotoras da introdução das ideias de Newton no Continente, fazendo ela própria uma tra
dução dos Principia e encorajando a divulgação do conceito de gravidade enquanto mecenas de autores de tratados com títulos como Newton Para Senhoras. É notável, na sua reflexão sobre a felicidade, a simplicidade como reconhece o estatuto desfavorecido das mulheres em relação aos homens, todas as coisas que às mulheres são vedadas, sem por isso deixar de apresentar alternativas sobre o que uma mulher pode fazer para ser (quase) tão feliz como os homens.