sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Orgulho e preconceito em James Watson

Teria hoje lugar no Science Museum, em Londres, a conferência de James Watson para apresentar o livro “Avoid Boring People: Lessons from a Life in Science”, que o museu decidiu cancelar, na sequência das declarações de preconceito racial proferidas pelo cientista ao "The Sunday Times." Esta decisão provocou um acalorado conjunto de reacções, a que não escapou a lista britânica de história da ciência, Mersenne. A reacção pode parecer trivial: o Science Museum é uma instituição importante para a história da ciência, principalmente no Reino Unido, e o próprio Watson é, há cerca de meio século, um objecto importante da mesma história da ciência. O que não é trivial, é que a Mersenne nunca foi uma lista de debate, mas sempre uma lista exclusivamente informativa, e por isso com um reduzido débito de mensagens.
As posições manifestadas são muito variadas, tanto as que são contra como as que são a favor do cancelamento. As primeiras incluem os que entendem ser má qualquer medida que contrarie o livre debate de ideias, os que entendem que Watson deveria ter direito a manifestar em pessoa as suas posições, sem estas serem alteradas pelo media, e a sujeitar-se directamente à sua crítica, e ainda os que consideram que o cancelamento promoveu uma desnecessária publicidade para Watson e as suas posições.
Embora concorde que o cancelamento beneficiou precisamente a promoção do livro de Watson, não posso deixar de compreender que o Science Museum não só se quisesse distanciar das suas declarações, como aproveitasse a ocasião para enviar uma mensagem de sinal contrário, principalmente dirigido à juventude inglesa de origem asiática e africana.
As restantes instituições incluídas no périplo do lançamento do livro de Watson, podem legitimamente considerar outras tácticas, como a de promover o protagonismo de pontos de vista contrários. Mas isso não deverá ser feito em nome da defesa da liberdade de expressão e debate de ideias científicas. Principalmente porque, não decorrendo de qualquer investigação séria ou mesmo da sua área de especialidade, as opiniões de Watson sobre a relação entre inteligência e a raça não são opiniões científicas, que as universidades tenham obrigação (pelo menos neste contexto) de debater.
Watson foi sempre muito desbocado no que respeita a considerações pejorativas sobre povos não brancos (ou melhor, não provenientes da Europa do Norte), mulheres, homosexuais, obesos e mesmo ... matemáticos. James Watson tem, como todos nós, direito a seguir e a manifestar o seu senso comum e os seus preconceitos. Ele (e nós) não pode é fazê-los passar por ciência.

Post-scriptum: O lado lusitano do tema
Imagem:
J. Watson, com Leonor Beleza, recebido em Belém em Março de 2007.

Será curioso conhecer melhor as posições de James Watson sobre os níveis de inteligência dos indianos, tendo em conta as suas funções na Fundação Champalimaud e o grupo a que pertencem os beneficiários do 2007 António Champalimaud Vision Award.