terça-feira, 31 de julho de 2007

GRANDES CAPAS

Die biologische Tragödie der Frau (em português, a Tragédia Biológica da Mulher) é uma obra do professor Antoni W. Nemilow, da Universidade de Lenigrado, Rússia. Mais interessante ainda que a própria obra é o facto de ter sido publicada (em 1925) por uma mulher, nem mais nem menos que Alexandra Ramm-Pfemfert (publicou, entre outros, Leo Trotzki, Anna A. Karawajewa, Elena A. Nagrodskaja, Mohamed Aischin, Michail N. Pokrowski). Foi depois traduzida para várias línguas e amplamente divulgada. É um livro muito interessante. A começar pelo título que, à partida, parece querer dizer tudo sobre o que vem a seguir. Mas não. Logo na introdução o autor faz questão de dizer que «é possível que o título que eu escolhi para este livro não seja o mais conveniente, porque as palavras "tragédia" e "trágico" se têm interpretado, segundo os tempos, de diferente maneira». Os tempos de hoje levar-nos-ia, intuitivamente, a ter uma ideia negativa sobre a palavra "tragédia". Muito provavelmente, ao lermos este título, pensaríamos que se tratava de um livro a justificar a inferioridade da mulher, do ponto de vista da biologia. Mas não. Antes pelo contrário. Este livro foi escrito com intenções políticas que vão precisamente no sentido de afirmar o homem e a mulher como «equipotenciais». O autor é muito claro no prólogo ao livro. «Com este livro me propuz contribuir para a obra a que na Rússia chamamos "Liquidação do Analfabetismo" facultando ao leitor, sob uma forma vulgarizadora, o ABC da questão sexual». Fala até numa «nova moral sexual», totalmente abstraída de uma «interpretação eclesiástico-cristã» e de um conceito de mulher-escrava «hipocritamente idealizada e cantada pelos poetas». E depois , imediatamente depois, cola esta «nova moral sexual» a um ideal político. Convém relembrar que este livro foi publicado numa URSS comunista dos tempos de Lenine, Estaline e Trótski. Aliás, o próprio Trótski participa em 7 de Dezembro de 1925, na Terceira Conferência Sindical sobre a Protecção às Mães e às Crianças, discursando sobre a protecção das mães e a luta pela elevação do nível cultural. O livro de Nemilow não destoa. «Desde que o poder passou na Rússia às mãos dos proletários, as velhas ideias àcerca da moral desapareceram», diz ele logo no prólogo. E continua, «O proletariado - e especialmente a sua parte mais importante: a juventude - trata de fundar uma nova moral sexual; ou, como poderíamos dizer, a evolução histórica busca actualmente novas normas para a vida sexual. Não há dúvida, em troca, que a biologia do sexo e a sexologia hão-de constituir as suas bases, reforçadas com as considerações engenéticas por um lado, a consciência duma grande responsabilidade em cada acto inter-sexual; e, por outros, a extrema atenção para cada nova existência; mas, sobretudo uma sinceridade absoluta em todas as questões desta natureza. Sobre tais bases se edificam actualmente na Rússia as novas normas». Mais, «À semelhança dos antigos pagãos, nós, os russos, consideramos a vida sexual como a fonte de alegria dos acontecimentos mais intensos e das mais altas e fecundas emoções. Mas sabemos, graças à Biologia, que o homem tem de administrar cautelosamente tão alto benefício, se não quiser adquirir dores em lugar de gozos... Na Rússia Soviética ignoramos essa condição da mulher que vemos nas obtas de Moebins e de Otto Weiguinger. Para nós, a mulher é uma companheira, um membro da sociedade com plenitude de direitos como o homem. Combatemos categoricamente a teoria da "inferioridade da mulher"». Nemilow dá o seu contributo. O seu livro segue sempre um fio condutor. O sentimento de tragédia biológica é uma ilusão. E é uma ilusão eficaz sobretudo «nos países de formas sociais atrasadas». Mudando o ponto de vista, então passamos a ver a mulher tal e qual vemos o homem. E esse ponto de vista, segundo Nemilow, deve ser sintetizado numa nova fórmula «tendo em conta o avanço das ciências biológicas». Assim se pensava naquele tempo.

A edição portuguesa (em cima) é da Guimarães & Editores, Lda. e foi publicada em 1934. A brasileira (ao lado) foi publicada em 1935.